Racismo Ambiental no Brasil: Uma Herança Histórica e Estrutural
O racismo ambiental no Brasil não é um fenômeno isolado, mas sim um reflexo de um sistema que, ao longo dos séculos, consolidou desigualdades territoriais e sociais. Para compreender sua profundidade, é necessário olhar para a história e reconhecer que a exclusão da população negra do acesso à terra foi institucionalizada desde o século XIX.
Em 18 de setembro de 1850, a assinatura da Lei de Terras pelo imperador Dom Pedro II marcou um divisor de águas na política agrária brasileira. Essa legislação estabeleceu que a posse de terras só poderia ser adquirida por meio da compra, eliminando a possibilidade de ocupação legítima por trabalho. Na prática, isso significou que ex-escravizados, recém-libertos pela abolição da escravatura, não tinham meios para garantir propriedade sobre o território que cultivavam. Enquanto grandes latifundiários e políticos consolidavam suas posses, a população negra era empurrada para a marginalização urbana e rural.
Essa estrutura fundiária excludente perpetuou um modelo de desenvolvimento que favoreceu elites agrárias e industriais, ao mesmo tempo em que negava direitos básicos às comunidades negras e indígenas. O racismo ambiental, portanto, não é apenas uma consequência da desigualdade social, mas um mecanismo que deliberadamente distribui os impactos ambientais de forma desigual.
Um dos exemplos mais evidentes dessa lógica é a localização dos aterros sanitários e lixões. Estudos demonstram que bairros periféricos, onde há maior concentração de população negra, são frequentemente escolhidos para receber esses depósitos de resíduos, expondo seus moradores a riscos de contaminação e doenças. Enquanto isso, regiões nobre permanecem protegidas dessas externalidades ambientais.
Além dos aterros sanitários, o racismo ambiental se manifesta na falta de saneamento básico, na poluição industrial concentrada em áreas de baixa renda e na vulnerabilidade de comunidades periféricas a desastres climáticos. A ausência de políticas públicas eficazes para mitigar esses impactos reforça a exclusão e perpetua um ciclo de injustiça ambiental.
A luta contra o racismo ambiental exige uma abordagem interseccional, que reconheça a relação entre desigualdade racial, acesso à terra e impactos ambientais. É fundamental que políticas de planejamento urbano e sustentabilidade sejam formuladas com participação ativa das comunidades afetadas, garantindo que soluções ambientais não apenas reduzam emissões de carbono, mas também promovam equidade e justiça social.
O Brasil precisa enfrentar essa realidade com urgência, reconhecendo que a crise ambiental não pode ser dissociada da desigualdade histórica que moldou seu território. Sem justiça ambiental, qualquer tentativa de sustentabilidade será incompleta e continuará perpetuando exclusões estruturais.